Morre Gominho, a "Patativa" que amolecia corações
Quís Deus que Gominho fosse embora da vida aos 93 anos numa segunda-feira de carnaval, subindo aos céus ao som da Vassourinhas. A cidade de Princesa nunca mais será a mesma sem ele, sem os seus discursos inflamados, sem a sua cerveja "com escuma", sem suas tiradas de gênio, sem o seu chapéu de massa, sem a caminhada frenética e nervosa em busca de votos. Ele foi primeiro sem segundo, digo sem medo de errar. Aqui vai uma pequena mostra do que foi Gominho, contada por Paulo Mariano, o historiador princesense de maior respeito, que fala depois dos dois pontos e a partir das aspas:
"Manoe. Gomes de Souza, o popular Gominho, foi durante muito tempo o político mais festejad do municipio de Princesa. Cabo eleitoral eficiente, vereador por várias legislaturas, presidente da Câmara Municipal e prefeito. Aliás, quando tomou posse no cargo de Vice-Prefeito, encontrou-se com o tenente Cornélio e foi logo advertindo: "Agora vamo butá orde na puliça!"
Sempre que utilizava o palanque para falar, arrancava gostosas gargalhadas e palmas estrepitosas do público. Homem simples, humilde e correto; chegava a ser ingênuo. Como a maioria do povo do interior, não frequentou escolas.
Mais de trinta anos de atividade política e nunca perdeu uma eleição. Ficou invicto e repetia com orgulho: "Tô ureiudo. Nuna perdi uma política."
No início da carreira, nos comícios, sopravam as frases: "Meus valorosos companheiros...". Gominho repetia sorridente: "Meus dolorosos companheiros...".
Costumava dizer: "Eu faço política de janeiro a dezembro". Era verdade. Tomava café, almoçava e jantava política. Sonhava com política e nunca sentiu o pesadelo de uma derrota. Gostava de trabalhar na política sozinho e justificava: "O boi sôrto se lambe todo". Tornou-se sociável: "Quando eu vou pruma festa faço o maior istrupiço".
Em 1975, o grande repentista Otacílio Batista foi apresentado a Gominho na casa de Marçal Lima (o velho) e ouviu: "Prazer. Manoel Gomes de SOIZA". O poeta Otacílio respondeu ao cumprimento em versos:
Eu não sei se é impossibilidade/Se o nome Souza é diferente/Manoel Gomes de SOIZA está presente/importante figura da cidade."
Numa reunião em que estava presente o juiz de Direito, Dr. Irenio Paes Barreto, em 1978, insistiram pra Gominho falar. Levantou-se, estirou o braço na direção do juiz e começou com a voz pausada: "Sua Santidade Dr. Irênio". Perguntaram certa vez: "Por que você trabalha tanto em política?" A resposta veio rápida: "A gente só vai pru andô se tiver gente pra levá". E acrescentou convicto: "O que vale em política é voto na urna e não fofoca de calçada".
Conhecia palmo a palmo o município: "Quem mora na ardeia é quem conhece os cabôco." Tinha planos para o futuro: "Vocês vão me ajudá, pra cê ajudado, mais do que me ajudaro." Repetia sempre: "O negoço num é cê, é sabê cê." Procurava acompanhar a facção política que tinha mais chances de ganhar. Justificava: "A fôça maió combate a menó." Como todo político que se prezava, Gominho adorava elogios: "Quando falá de mim, dê a caiga toda."
Num de seus famosos discursos, fazendo uma "sodação" ao gerente do Banco do Brasil, notou a presença de uma jovem ao recinto e construiu uma linda imagem poética ao afirmar empolgado: "Você parece uma andorinha beijando a fulô." Era bem relacionado e aconselhava: "Tenha sempre um amigo a mais." Fazia parte dos seus planos atingir a Prefeitura Municipal e advertia: "Bom sou eu que rebanho votos". E prometia aos correligionários: "Vou mandá prepará pros meus amigos uma buchada de tatu". Certa vez, um agitador tentou apartear Gominho, numa festa da AABB local, e ele demonstrou que também entendia de política internacional ao afirmar sangado: "Seu morasse em Cuba, mandava te afuzilá".
Quando comparecia a uma rodada de cerveja era a atração maior. Apesar de ter dedicado sua vida à política, não gostava de promessas de políticos profissionais: "Mais vale uma rapadura sargada do que uma promessa doce." E arrematava: "A maliça da política é entendê política."
Pois bem, agora falo eu, Tião Lucena. Quando passei no vestibular, em 1975, papai fez uma farra enorme na nossa casa do Cancão para comemorar a proeza. O orador oficial da festa foi Gominho, que, depois de engolir uns cinco copos de cerveja com espuma, chemou a mim e aos outros irmãos de "as jovens de Migué", para depois garantir que "eu não sou bacharé, mas sei fazer discurso em português, ingrês e matemática".
O seu maior orgulho era comparar-se a Alcides Carneiro, nosso conterrâneo: "Esse negócio de oratória é de famia". Seu apelos, feitos dos palanques, surtiam um efeito danado. Certa vez, num comício realizado em Jericó, confessou toda a sua falta de vaidade: "Eu poderia tá na minha casa a essa hora, cumeno feijão de arranca novinho, tirado da baje. Mas em vez disso, vim praqui cumê o furado de vocês."
Falando ao governador Burity para agradecer a chegada da irrigação às várzeas de Princesa, confessou emocionado: "Doutô Burity, aqui virou uma festa: é as mué abrindo os regos e os homis enfiando os cano".
(Extraido do Blog do Tião Lucena)
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